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Durante mais de dois meses, a Agência Mene Portela, em parceria com o professor Auxiliomar Silva Ugarte, buscaram em registros antigos os símbolos contidos no escudo (Foto: Divulgação)
Manaus – O símbolo maior de Manaus – leia-se: o brasão impresso na bandeira do município – teve sua arte resgatada, trazendo consigo parte importante da história da cidade. Durante mais de dois meses de pesquisa, a Agência Mene Portela, em parceria com o professor Auxiliomar Silva Ugarte, do Departamento de História da Universidade do Federal do Amazonas (Ufam), buscaram em registros antigos os símbolos contidos no escudo, a pedido da Prefeitura Municipal de Manaus.
De acordo com o diretor de arte da agência, Beto Coelho, que dividiu os trabalhos com o também diretor Ramon Gurgel, a ideia sempre foi unificar toda a comunicação municipal por meio do uso do escudo. “Quando recebemos essa missão, iniciamos um processo de pesquisa que nos proporcionou o contato com documentos históricos e, com isso, inúmeras versões do brasão que foram sendo reproduzidos ao longo de décadas”, explica.
Durante o processo, tanto a agência, quanto o professor, tiveram acesso a uma diversidade de informações, dentre elas, uma arte que está guardada no antigo prédio da Prefeitura, localizado no Paço da Liberdade (Centro). “Mas nós queríamos mais do que aquilo. Então, encontramos na biblioteca pública, um livro que continha a reprodução mais fiel do brasão, mas sua página tinha sido arrancada. Foi quando tomamos conhecimento que outro exemplar deste mesmo livro existia, mas no Rio de Janeiro”, comenta.
A partir disso, e com o pensamento alinhado, a equipe deu início ao processo de restauro do escudo com a ajuda do ilustrador César Edgar. “Com as ferramentas digitais em mãos pudemos começar todo o processo, produzindo versões diferenciadas de cada símbolo existente dentro do brasão”, diz ele que, após inúmeras apresentações, teve o projeto aprovado e lançado, na última semana, pela Prefeitura Municipal de Manaus.
“Hoje, quando o manauara olhar a bandeira da cidade, encontrará o reflexo de uma administração que preza não apenas pelo cuidado da cidade, mas também pelo resgate de sua história. Além disso, o brasão, assim como os prédios históricos, é um patrimônio e merece ser visto com a mesma importância. A cidade vai se reconhecer nele”, afirma.
Pesquisa
Assim como qualquer projeto que envolva o resgate da memória de uma cidade, Estado ou país, é necessário contar com o suporte de estudiosos na área. E foi justamente aí que entrou o professor o conhecimento do professor Auxiliomar Silva Ugarte. “De certa forma, a história sobre a criação e a atual versão do brasão estavam difusas. Diversos sites da internet apresentavam elementos equivocados. Então, com o contato da Agência Mene Portela começamos um processo de pesquisando, partindo do decreto que criou o símbolo, datado de 1906”, lembra.
O professor explica que o escudo possui três sessões, sendo eles divididos em duas partes nos cantos (direito e esquerdo) e uma na parte central (inferior). “O canto superior esquerdo representa a passagem da expedição comandada pelo espanhol Francisco Orellana, em 1542, dia, inclusive, que o Rio Negro foi batizado com este nome. Região que mais tarde seria situado o local mais primitivo da cidade e que daria origem a Manaus”, conta. Nela, é possível observar dois bergantins (espécie de embarcação) com dois remadores.
No canto direito, é a representação do Forte de São José do Rio Negro, que foi escolhido para ser o núcleo primitivo do que seria Manaus, com a presença de duas figuras humanas, sendo um homem e uma mulher. “O homem, no caso, é um militar português e a mulher uma índia. Juntos, eles representam a aliança entre os colonizadores e os habitantes do lugar. É importante ressaltar a figura feminina, pois de fato ocorreu um casamento”.
Já na terceira sessão, a maior de todas, recuperou-se a figura da seringueira que, até então, em outras representações davam a entender, para quem observava, que era uma castanheira. “Identificamos isso por conta do formato da árvore. Quando o decreto foi emitido, em 1906, pelo superintendente municipal Adolpho Lisboa, a Amazônia, de modo geral, e Manaus, particularmente, se beneficiava do líquido extraído da seringueira, cujo o maior produto era a borracha. Formando-se assim o brasão original”, observa.
Ugarte levanta, ainda, a hipótese de que o decreto tenha sido redigido por Taumaturgo Vaz que, à época, era secretário da superintendência. Vale ressaltar que naquele período a cidade ainda não contava com o cargo de prefeito, sendo então administratada pelo superintendente municipal.
“A partir de agora, o manauara verá um escudo esteticamente muito bonito e com a uma recuperação histórica, mais próxima do decreto que o criou. É preciso que haja um trabalho de explicação para o habitante e para o turista. Infelizmente, muitos manauaras não conhecem sua história e a importância desse símbolo. Se faz necessário um trabalho educativo para formar e reforçar a identidade do próprio município”, finaliza.
Óscar Ramos participou da concepção
Com uma vida dedicada às artes e dono de uma carreira com reconhecimento internacional, o artista plástico e designer Óscar Ramos foi um dos responsáveis pela concepção da arte final. “O nosso brasão define o espaço de nossa luta por nossa existência. É através dele que marcamos a nossa presença na construção desta civilização”.
Acostumado a pensar a composição espacial de exposições, de seleção e organização de linguagens e expressões artísticas, Óscar Ramos foi convidado a analisar o projeto e chegou a reunir-se com os designers responsáveis pela obra de arte digital, que utiliza a técnica de pintura digital e não a partir de vetores, como é mais comum. “Foi um encontro muito agradável, onde pudemos trocar várias figurinhas”, conta o artista e curador das exposições do Paço da Liberdade.