Houve um pequeno crescimento no percentual de mulheres eleitas no pleito de 2024, no entanto, os números demonstram que a equidade está longe de ser alcançada. Apesar dos esforços concentrados em medidas afirmativas que visam incentivar a participação de mulheres na política, a violência política se dissemina em novas roupagens, as candidaturas fictícias ou laranjas persistem e os números refletem avanço ínfimo, muito distante da igualdade que se quer.
A desigualdade e a sub-representação feminina nas eleições municipais de 2024 são facilmente identificadas em percentuais discrepantes: 81,8% dos eleitos para o legislativo municipal são homens (47.792), enquanto apenas 18,2% são mulheres (10.654). Quanto as prefeituras, 727 cidades serão geridas por mulheres em 2025, número que corresponde a 13% do todo, enquanto 87% dos eleitos para comandar as prefeituras no Brasil, são homens (Fonte: CNN). No segundo turno das eleições, dos 102 candidatos, apenas 15 eram mulheres.
Segundo dados divulgados pelo Tribunal Superior Eleitoral, as mulheres somam 81.806.914 eleitoras, o que equivale a 52,47% do total. Os homens, por sua vez, totalizam 74.076.997 eleitores (47,51%). Um pequeno percentual, 0,02%, correspondente a 28.769 pessoas, não informou o sexo.
“A distribuição geográfica do eleitorado revela que, em quase 62% dos municípios brasileiros, as mulheres são maioria, totalizando 3.432 localidades onde o eleitorado feminino supera o masculino. Em contraste, 38% dos municípios, ou 2.126 localidades, têm a maioria de homens votantes.” (Fonte: TSE).
Não obstante representemos a maioria do eleitorado, estamos longe de atingir a equidade na representação feminina nas casas legislativas e igualmente, no poder executivo, onde os percentuais são mais vergonhosos. A situação se torna pior, se consideramos a participação de mulheres negras na política, cuja exclusão é aviltante.
Destacam-se neste cenário de sub-representação, casos recorrentes de violência política que neste pleito tiveram especial materialização através da circulação de “deep nudes” ou “fake nudes”, que são imagens em vídeo ou foto, manipuladas através de inteligência artificial, onde se utiliza o rosto de uma pessoa, neste caso, da mulher candidata, inserida numa cena em que esteja nua ou engajada num ato sexual. Os programas de “deep fake” que produzem imagens demasiadamente realistas, foram utilizados neste pleito, em prol da propagação da violência política e de gênero, a fim de descredibilizar a participação feminina na política.
Observem que esta modalidade de ataque perverso não foi perpetrada contra homens, uma vez que, a misoginia por detrás dos ataques, tenta afastar a competência feminina para ocupar espaços na política, através da hipersexualização. A produção de “deep nudes” é crime, além do que, é possível descobrir a autoria deste crime vil, não restrito ao anonimato.
As candidaturas laranjas começam a aparecer pouco a pouco. Dentro em breve, conheceremos os inelegíveis oriundos das eleições 2024 por fraude na cota de gênero, bem como, aqueles que perderão o mandato por insistirem em burlar a legislação vigente que impõe o percentual mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo, nos termos do artigo 10, parágrafo 3º da Lei nº 9.504/1997 (Lei das Eleições).
É notória a severidade com a qual o Tribunal Superior Eleitoral vem tratando o tema, não sem razão, os números supramencionados demonstram a necessidade de rigor na aplicação da norma, contudo, num ato de extrema falta de lucidez, alguns insistem em excluir as mulheres do jogo político e pagar o preço do preconceito. Preço alto, diga-se de passagem. Ressalto, há verba para tornar as candidaturas femininas competitivas, cabe aos partidos utilizarem-na para este fim.
Por fim, nos resta celebrar os pequenos avanços, pois, para chegarmos até aqui, o caminho foi tortuoso e continuará sendo por muito tempo. Pontuar as pedras no caminho é importante para que não esqueçamos também os avanços e em hipótese alguma, aceitemos os retrocessos que vez por outra tentam nos impor. Não renunciar aos direitos até aqui conquistados é inegociável.
*Gabriela Barile Tavares, especialista em direito eleitoral pelo Instituto Brasiliense de Direito Público