A necessidade de resiliência, humildade e serviço: uma análise do poema “If” de Rudyard Kipling

O poema de Kipling ressoa profundamente ecos da filosofia clássica e suas lições sobre a arte de viver

Meu querido amigo Heraldo Beleza Câmara me enviou um vídeo em que declama este lindo poema de Kipling. De súbito, senti uma incontrolável necessidade de examinar essa pérola da literatura inglesa à luz dos ensinamentos filosofia clássica

O Poema “If” de Rudyard Kipling

_Se podes manter a calma quando todos ao teu redor
Já a perderam e te culpam;
Se podes confiar em ti mesmo quando todos duvidam, mas permites que duvidem também;
Se podes esperar sem te cansar da espera,
Ou, enganado, não pagas com mentiras,
Ou, odiado, não dás espaço ao ódio,
E ainda assim não pareces bom demais, nem falas com sabedoria excessiva;

Se podes sonhar – e não te deixas escravizar pelos sonhos;
Se podes pensar – e não fazes dos pensamentos teu objetivo;
Se podes encontrar o Triunfo e o Desastre
E tratar esses dois impostores do mesmo modo;
Se podes suportar ouvir as verdades que disseste
Deturpadas por trapaceiros para enganar os tolos,
Ou ver as coisas pelas quais deste a vida, destruídas,
E inclinar-te e reconstruí-las com ferramentas desgastadas;

Se podes juntar todos os teus ganhos
E arriscá-los de uma só vez numa única aposta,
E perder – e começar de novo do início
Sem nunca murmurar uma palavra sobre tua perda;
Se podes forçar teu coração, nervos e tendões
A trabalhar por mais um tempo, mesmo exaustos,
E assim resistir quando não há mais nada em ti
A não ser a Vontade que lhes diz: “Resistam!”

Se podes falar com multidões e manter tua virtude,
Ou caminhar ao lado de reis – sem perder o toque comum;
Se nem inimigos, nem amigos amorosos podem ferir-te;
Se todos contam contigo, mas nenhum em excesso;
Se podes preencher o inexorável minuto
Com sessenta segundos de valor, percorridos;
Tua será a Terra e tudo o que há nela,
E – o que é mais – serás um Homem, meu filho!_

A Filosofia da Arte de Viver e o Poema de Kipling

O poema de Kipling ressoa profundamente ecos da filosofia clássica e suas lições sobre a arte de viver. Pensadores estoicos como Sêneca, Epicteto e Marco Aurélio ensinaram princípios que se correlacionam com as virtudes apresentadas no poema. Kipling descreve um ideal de ser humano equilibrado, que encontra força em sua resiliência, humildade e compromisso com o bem comum.

1. Resiliência e a Filosofia Estoica

A capacidade de “manter a calma quando todos ao teu redor já a perderam” é um chamado direto do estoicismo, que ensina a aceitar os acontecimentos da vida com serenidade. Marco Aurélio, em Meditações, enfatiza que o verdadeiro poder está no controle das reações internas, não nos eventos externos.

2. Humildade e a Moderação Aristotélica

Kipling exalta o equilíbrio: “não pareces bom demais, nem falas com sabedoria excessiva”. Aristóteles ao ensinar que a “virtude consiste em saber encontrar o meio-termo entre dois extremos” propõe a moderação como a base para um comportamento correto. O indivíduo virtuoso evita os extremos e encontra na humildade um caminho de excelência moral.

_3. Serviço e o Bem Coletivo em Confúcio_

A habilidade de “caminhar ao lado de reis – sem perder o toque comum” remete à visão confuciana de que o verdadeiro líder serve aos outros e mantém sua conexão com o povo. Para Confúcio, o serviço ao próximo é a base de uma vida moralmente elevada.

A Elevação do Ser Humano: Um Ideal de Serviço

No clímax do poema, Kipling afirma que, ao dominar essas virtudes, o homem ganha “a Terra e tudo o que há nela”. No entanto, esse “ganhar” não deve ser interpretado como uma conquista material, mas como a capacidade de viver em plenitude, dedicando-se ao bem daqueles que ama.

Esse ideal se alinha à filosofia do amor altruísta, presente tanto em tradições ocidentais quanto orientais. O homem elevado, descrito por Kipling, é aquele que não apenas resiste às adversidades e abraça a humildade, mas também entende que sua realização está vinculada ao serviço aos outros.

Conclusão

O poema If é mais do que um manual de ética; é um convite à elevação do ser humano. Ao incorporar as lições de resiliência, humildade e serviço, cada indivíduo pode transformar-se em uma força positiva no mundo. Essa transformação não é apenas uma realização pessoal, mas um ato de amor e cuidado para com os que o cercam.

Kipling nos lembra que, em um mundo repleto de desafios e incertezas, a virtude humana é a única resposta permanente e universal. Que possamos viver à altura desse ideal, sempre em busca do bem maior.

 

(*) O autor é advogado, Procurador do Estado aposentado ex Procurador-GeraldoEstadodoAmazonas. Dedica este artigo ao amigo Heraldo Beleza da Câmara.