Reforma Tributária Brasileira na contramão do desenvolvimento

A política tributária é um dos principais fatores que determinam o crescimento econômico

As convicções que me levam a escrever sobre esse tema vão além do raciocínio lógico-formal. Conheci Miami Beach e Nova York antes de suas revitalizações e pude acompanhar de perto o impacto positivo dos modelos de incentivos fiscais implantados nessas cidades.

A política tributária é um dos principais fatores que determinam o crescimento econômico e a estabilidade financeira de um país. No entanto, enquanto países e cidades bem-sucedidos reduziram impostos para estimular a economia e superar crises fiscais, o Brasil insiste em aumentar a carga tributária, sufocando a produção, inibindo investimentos e aprofundando sua crise fiscal.

A história econômica mostra que o aumento da carga tributária raramente resolve crises fiscais. Diversos países, como os Estados Unidos na década de 1970, Argentina, Grécia e França, tentaram solucionar déficits fiscais com mais impostos, mas o resultado foi estagnação econômica, fuga de capitais e piora das contas públicas.

Por outro lado, cidades como Nova York e Miami Beach, seguindo a política tributária perseguida por Donald Trump, quando começou a emprender nos 1970, e ampliada por Ronald Reagan nos anos 1980, conseguiram reverter crises profundas ao reduzir impostos, atrair investimentos e revitalizar suas economias.

No Brasil, temos um exemplo interno de sucesso: a Zona Franca de Manaus (ZFM), que, por meio de incentivos fiscais, conseguiu gerar empregos, atrair indústrias e preservar a floresta amazônica.

Neste artigo, analisamos esses casos e propomos uma alternativa viável para o Brasil, baseada na preservação da ZFM e na implementação de incentivos fiscais estratégicos para outras regiões e setores, sem comprometer a competitividade de Manaus.

1. O Aumento da Carga Tributária Como Gerador de Crises Fiscais

1.1. Estados Unidos nos Anos 1970: O Primeiro Passo dos Incentivos Fiscais

Nos anos 1970, os Estados Unidos enfrentavam uma grave crise econômica e fiscal, com inflação alta e crescimento econômico estagnado. A carga tributária sobre indivíduos e empresas era excessivamente alta, chegando a 70% para rendas elevadas.

A situação era tão absurda que muitos profissionais liberais, como médicos e advogados, trabalhavam apenas seis meses por ano, pois se trabalhassem o ano todo, acabariam recebendo menos dinheiro líquido do que trabalhando metade do tempo devido ao peso dos impostos.

Nova York, que já enfrentava uma crise fiscal grave, precisava de soluções urgentes para evitar o colapso. Foi então que Donald Trump, então um jovem empreendedor do ramo da construção civil, propôs um modelo de revitalização baseado em incentivos fiscais.

A reconstrução do The Commodore Hotel (atual Grand Hyatt New York), conduzida por Trump nos anos 70, foi o primeiro grande caso de incentivos fiscais na cidade. Ele conseguiu convencer o prefeito de Nova York e o board da cidade de que conceder uma isenção de impostos por 40 anos era fundamental para atrair investimentos privados e recuperar a economia local.

Essa abordagem não foi fácil porque questionava-se na época como uma cidade endividada poderia conceder incentivos fiscais? Depois de muita discussão houve consenso em que o projeto era importante para a cidade.

Com efeito, o projeto foi um sucesso, criando empregos, atraindo mais investimentos e revitalizando o setor hoteleiro e comercial. Esse caso se tornou o pontapé inicial para a transformação de Nova York, melhorando todos os seus segmentos econômicos.
Esse modelo seria ampliado na década de 1980 pelo presidente Ronald Reagan, que viu nos incentivos fiscais uma maneira de estimular o crescimento econômico nacional.

2. Os Casos de Sucesso: Nova York e Miami Beach

2.1. Nova York: O Modelo de Trump Expandido por Reagan

Nos anos 1970, Nova York estava à beira da falência fiscal. A cidade enfrentava:

  •  Déficits orçamentários massivos.
  •  Fuga de empresas e desemprego elevado.
  •  Criminalidade crescente e degradação urbana.

A solução veio por meio de isenções fiscais e parcerias público-privadas para atrair investimentos. Exemplos:

* Reconstrução do Hotel Commodore (atual Grand Hyatt New York), liderada por Donald Trump, que marcou o início da recuperação econômica da cidade.
* Revitalização da Times Square, com incentivos para empresas do setor de entretenimento e turismo.
* Redução da burocracia e incentivos para novos negócios, restaurando a confiança dos investidores.

Esse modelo, na verdade, antecipou em pelo menos uma década, a lógica da Reaganomics, permitindo que o setor privado liderasse o crescimento econômico.

Importante destacar que a política de incentivos inaugurada com.as demandas de Trump nos anos 1970nfoi ampliada pelo governo Reagan na década de 1980, impulsionando um grande crescimento econômico nos EUA. Não é à toa que Trump ressuscitou o bordão de Reagan: Make America Great Again (MAGA).

3. Argentina: Como Milei Está Revertendo a Crise Combinando Cortes e Incentivos

A crise econômica argentina não foi criada por Javier Milei, mas sim pelo modelo de alta tributação e intervenção estatal aplicado pelos governos anteriores. Durante anos, a Argentina:

  • Aumentou impostos sobre empresas e exportações agrícolas, desestimulando a produção.
  •  Expansão descontrolada do gasto público, levando a déficits recorrentes.
  •  Impressão descontrolada de moeda, resultando em hiperinflação e desvalorização do peso.

Milei assumiu em um cenário catastrófico, com inflação descontrolada e recessão. Sua estratégia para reverter o colapso combina corte de gastos e incentivos fiscais, demonstrando que não basta reduzir o tamanho do Estado; é preciso estimular a atividade produtiva.

Entre suas medidas estão:

  •  Régimen de Incentivos para Grandes Inversiones (RIGI): Isenções fiscais e cambiais por 30 anos para atrair investimentos acima de US$ 200 milhões em setores estratégicos.
  •  Redução de impostos sobre exportações agrícolas, incentivando o setor mais produtivo do país.
  • Eliminação de impostos sobre importações, reduzindo preços e aumentando a competitividade.

Seus primeiros meses mostram que a recuperação da Argentina não virá apenas com cortes, mas sim com uma combinação de austeridade e incentivos para o setor privado crescer.

4. A Zona Franca de Manaus: Um Exemplo Brasileiro de Sucesso

A Zona Franca de Manaus (ZFM), criada em 1967, é um exemplo de que incentivos fiscais funcionam no Brasil. Seus impactos positivos incluem:

  • Geração de milhares de empregos diretos e indiretos.
  •  Atração de grandes indústrias, fortalecendo a economia do Amazonas.
  •  Preservação ambiental, ao oferecer uma alternativa econômica sustentável para a floresta.
  •  Equilíbrio fiscal, pois, apesar das renúncias tributárias, a arrecadação indireta compensa os incentivos.

Sem a ZFM, a economia do Amazonas dependeria quase exclusivamente de atividades primárias, aumentando a pressão sobre a floresta.

5. Expandir os Incentivos Sem Comprometer a ZFM: Um Novo Modelo Fiscal

A pergunta que surge é: se os incentivos da ZFM funcionam, por que não expandi-los para outras regiões? A resposta é que a Zona Franca não pode ser simplesmente replicada, pois isso eliminaria sua vantagem competitiva e comparativa com outros Estados. A solução ideal é um modelo complementar que beneficie outras regiões sem comprometer a ZFM.

5.1. Criação de Zonas de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial (ZDTIs):

* Estímulo a setores estratégicos, como semicondutores, biotecnologia e inteligência artificial.
* Isenções fiscais progressivas, condicionadas ao desempenho econômico e geração de empregos.
* Descentralização, com instalação de polos produtivos em cidades de médio porte.

Exemplo prático:

  • Criar um polo de biotecnologia no Centro-Oeste, aproveitando a proximidade com o agronegócio.
  •  Criar uma ZDTI para semicondutores no Nordeste, reduzindo a dependência de chips importados.

5.2. Reformulação do Simples Nacional e Desoneração da Folha de Pagamento:

* Redução de tributos sobre a folha de pagamento, incentivando a formalização de empregos.
* Expansão do Simples Nacional, tornando-o mais flexível e menos burocrático.

6. Proteção Constitucional da ZFM e Segurança Jurídica: Como Garantir um Modelo Sustentável

A Zona Franca de Manaus (ZFM) é um dos raros exemplos de política tributária bem-sucedida no Brasil. Criada para compensar os desafios logísticos e promover o desenvolvimento regional, sua proteção constitucional até 2073 garante previsibilidade para investidores e indústrias que operam na região. No entanto, a criação de novos modelos de incentivos fiscais no Brasil deve ser feita sem comprometer a competitividade da ZFM.

A experiência de outros países demonstra que a insegurança jurídica e a falta de compromisso com incentivos fiscais podem afastar investimentos e inviabilizar setores produtivos. Para evitar que isso ocorra com a ZFM, é necessário estruturar um modelo de segurança jurídica que preserve sua competitividade ao mesmo tempo em que permite a criação de novas Zonas de Desenvolvimento Tecnológico e Industrial (ZDTIs) em outras regiões do Brasil.

6.1. Princípios Fundamentais para Garantir a Segurança Jurídica da ZFM

Para garantir que a criação de novas ZDTIs não seja usada como pretexto para questionar ou reduzir gradualmente os incentivos da ZFM, algumas diretrizes fundamentais devem ser seguidas:

a) Blindagem Constitucional e Regulatória

A proteção constitucional da ZFM deve ser reforçada com a adoção de mecanismos jurídicos que impeçam qualquer redução arbitrária de seus incentivos antes de 2073. Isso pode ser feito por meio de:

  • Reforço da proteção na Constituição Federal, com uma emenda constitucional que impeça alterações nos incentivos da ZFM sem aprovação qualificada do Congresso Nacional e amplo debate com os setores produtivos.
  •  Criação de um Conselho de Proteção da ZFM, composto por representantes do setor produtivo, do governo federal e da sociedade civil, com a função de fiscalizar qualquer tentativa de alteração nos benefícios da ZFM.
  •  Inclusão de cláusulas de estabilidade tributária, garantindo que empresas que investirem na região tenham seus incentivos fiscais preservados por prazos já assegurados pela Constituição.

b) Criação de Novas ZDTIs sem Concorrência Predatória com a ZFM

A criação de ZDTIs em outras regiões do Brasil não pode ser feita de maneira que concorra diretamente com a ZFM, mas sim de forma complementar, incentivando setores distintos e agregando valor à economia nacional sem desviar investimentos da Amazônia.

Isso pode ser garantido por meio de:

  • Definição clara dos setores estratégicos para cada ZDTI, evitando duplicação de incentivos para os mesmos segmentos industriais.
  •  Estímulo à pesquisa e inovação, garantindo que novas ZDTIs tenham foco em tecnologia e desenvolvimento científico, enquanto a ZFM mantém sua vocação industrial e comercial.
  •  Mecanismos de compensação fiscal, assegurando que a arrecadação gerada por novas ZDTIs também contribua para o equilíbrio fiscal da União, sem reduzir os repasses à ZFM.

6.2 Garantia de Infraestrutura e Logística Competitiva para a ZFM

A preservação dos incentivos fiscais da ZFM não é suficiente se a infraestrutura da região continuar sendo um gargalo para a competitividade das indústrias locais. Para garantir um ambiente de negócios favorável, o governo deve investir em:

  • Melhoria das conexões logísticas entre Manaus e os principais centros consumidores do Brasil e do exterior, incluindo investimentos em transporte fluvial e aéreo.
  •  Infraestrutura digital e tecnológica, garantindo que a ZFM possa se beneficiar da revolução da indústria 4.0, com incentivos para a adoção de inteligência artificial, automação e digitalização de processos industriais.
  •  Apoio a programas de capacitação profissional e inovação, assegurando que a mão de obra local esteja preparada para os desafios da nova economia.

Conclusão: O Brasil Precisa de uma Reforma Tributária Pró-Crescimento

O Brasil está na contramão do desenvolvimento, insistindo em aumentar impostos para resolver crises fiscais, ignorando o fato de que países e cidades que adotaram essa estratégia fracassaram.

A Zona Franca de Manaus prova que incentivos fiscais funcionam, e o caminho correto não é extingui-los, mas sim expandir essa lógica de maneira inteligente, o que não é tarefa fácil, objeto de muitos estudos e debates, mas não podemos nos furtar de empreendê-la, sob pena de naufragarmos todos juntos.

A pergunta a se fazer agora é: quando o Brasil seguirá o caminho dos EUA e da Argentina de Milei, de Cingapura, Irlanda e de tantos outros de sucesso mindo afora, apostando no crescimento por meio de uma política tributária que gere incentivos balanceados com as diversidades regionais?

O futuro do crescimento e do desenvolvimento da economia brasileira, com efeitos positivos para a população, depende dessa decisão.

(*) O autor é advogado, Procurador do Estado aposentado e ex-Procurador-Geral do Estado do Amazonas. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários – IBET.