Em 1969, dois americanos concretizaram o imaginário lunar

Os americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin tornaram real aquilo que por décadas fez parte dos desejos humanos

Paris – Ao pousar na Lua em 1969, os americanos Neil Armstrong e Buzz Aldrin pisaram com seus próprios pés no astro que alimentou as fantasias da humanidade por anos.

“Um imaginário envolvendo a lua muito poderoso atravessou os séculos, até que o sonho se tornou realidade”, resume o astrofísico Jean-Pierre Luminet.

Nesta imagem obtida da NASA, o comandante da Apollo 11 Neil Armstrong trabalha perto do módulo lunar Eagle em 20 de julho de 1969. (Foto: Buzz Aldrin/Nasa/AFP)

Seja na literatura, na poesia ou no cinema, o satélite da Terra foi objeto por mais de 15 séculos, desde a antiguidade até a década de 1940, de expedições imaginárias, cada vez mais fantasmagóricas.

À Lua se viajou em uma onda durante uma tempestade em “História Verdadeira” de Luciano de Samósata no século II; com a ajuda do orvalho em “Viagem à Lua” de Cyrano de Bergerac, em 1657; ou mesmo em um barco voador em “As Aventuras do Barão de Münchhausen”, em 1785.

E nela estavam os demônios de “Somnium”, do astrônomo alemão Johannes Kepler (1634); cogumelos gigantes, como no filme poético de Méliès “Viagem à Lua”, de 1901; e selenitas (o nome dos supostos habitantes do satélite terrestre) que viviam na Lua de H. G. Wells em “Os primeiros homens na Lua”.

Mas tudo tem seu fim: a realidade finalmente alcançou a ficção científica, que se revelou racional e premonitória em obras como “Da Terra à Lua”, de Jules Verne (1865), onde se menciona a propulsão, ou no filme “A Mulher na Lua”, de Fritz Lang (1929), e a história em quadrinhos “Rumo à Lua: as aventuras de Tintim”, de Hergé (1950), em que apareceram os foguetes.

“Desde os anos 1930-1940, os avanços na indústria aeroespacial começaram a se concretizar. A viagem à lua passou a ser algo verossímil e o imaginário lunar ganha contornos claros”, explica Natacha Vas Deyres, professora de Letras da Universidade de Bordeaux-Montaigne.

E mais ainda, depois de “percebemos que a Lua era um astro completamente morto, que não havia muito o que fazer, exceto, é claro, avanços científicos”, diz Jean-Pierre Andrevon, escritor de ficção científica.

É neste momento que Marte assume a dianteira, com obras como “As Crônicas Marcianas”, do americano Ray Bradbury (anos 1940), “Life on Mars?”, o sucesso de David Bowie escrito no final dos anos 1960, a trilogia sobre Marte de Kim Stanley Robinson dos anos 1990 ou ainda “Perdido em Marte” de Ridley Scott, em 2015.

1969 e a entrada na cultura pop

“À medida que exploramos, expandimos os lugares onde situamos coisas extraordinárias”, explica o astrofísico Roland Lehoucq, presidente do festival internacional de ficção científica Les Utopiales.

Em 20 de julho de 1969, o grande passo para a humanidade terminou com o imaginário lunar?

De maneira nenhuma: “Depois de 1969, a Lua se tornou um objeto da cultura pop, dos mangás, das séries de televisão…”, comenta Natacha Vas-Deyres, que cita a série “Espaço: 1999” (1975-1977), “uma verdadeira série que marcou o imaginário da ficção científica”.

“E a aventura continua” com Grendizer (de 1975 a 1977), “o mais poderoso dos robôs” e o primeiro mangá animado. A Lua se torna um campo militar extraterrestre que deve ser destruído.

E mesmo se viajar para a Lua já não faz sonhar a tantos, o satélite não deixou de ser um solo fértil para alguns autores.

“Nós passamos a fantasiar com uma Lua cheia de homens vivendo sob cúpulas, em bases pressurizadas, etc. O que todo mundo tem em suas cabeças é a parte lunar de ‘2001: Uma Odisseia no Espaço’ (1968), de Stanley Kubrick”, lembra Jean-Pierre Andrevon.

Outros fantasiam com o lado oculto, como Pink Floyd e seu “The Dark Side Of The Moon” (1973), o álbum mais vendido do grupo.

blank

Buzz Aldrin foi o segundo homem a pisar na Lua (Foto: Neil Armstrong / Nasa / AFP)

A Lua também oferece a possibilidade de imaginar o futuro da Terra. O astro explode por causa das experiências militares de Georges-Jean Arnaud nos quadrinhos “La Compagnie des glaces) (1980-2005) e nos convida a refletir sobre a clonagem e inteligência artificial no filme “Moon” DE Duncan Jones (2009) e sobre o colonialismo em “Revolta  na Lua” (Robert A. Heinlein, 1966).

“Na ficção científica, independente do que façamos ou onde vamos, mesmo nas galáxias mais distantes, sempre colocamos problemas terrestres: a diferença, a luta pelo poder, a guerra, a colonização…”, aponta Jean-Pierre Andrevon.

Algumas questões estão se somando como a mudança climática e o fim da civilização “desde que nos tornamos seriamente conscientes do que nos espera”, acrescenta o escritor.

Anúncio
blank